segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

O povo de Israel

Desculpem o sumiço, para fugir das temperaturas negativas fomos para Israel. Nossa, tenho tanto para contar! Prometo voltar logo com dicas de viagens e fotos incriveis, mas quero começar pelo mais interessante: o povo. Entre tantas guerras, odio e destruição, pobreza e dificuldades, disputas e intolerância, eles ainda conseguem sentir orgulho do lugar aonde moram. Israel é um lugar sagrado para todos que nascem la: judeus, muçulmanos, cristãos - não importa. Um povo que aprendeu, muito antes de nos, o signifcado de miséria, de dor e de injustiça e por isso, teria todos os motivos para querer ir embora ou falar mal. Como fazem os brasileiros, sabe? Pois não foi nada disso que eu vi. Vi orgulho, amor, boca cheia em cada cidadão que faz questão de falar bem do seu pais. Vi sorrisos, boa vontade, bom humor, carinho, respeito, amizade. Nunca, em lugar nenhum onde estive, conheci pessoas tão generosas e especiais como em Israel.

Viajar sem pacote ou guia te obriga a interagir com os locais, pedir informações em Israel pode ser a parte mais gostosa da viagem se você se abrir para falar com eles (a lingua oficial é o hebraico, mas quase todos falam inglês). Eh dificil puxar assunto com alguém e ouvir uma resposta direta, os israelenses são generosos nas explicações. Em Tel Aviv, so queriamos saber se estavamos no caminho certo para chegar em Old Jaffa, mas o Ben não so fez um mapa, como nos deu nomes, endereços e telefones dos melhores restaurantes do lugar. "O Abu Hasan faz o melhor humus da cidade, não deixem de ir". Uma simples informação, que na França seria respondida em 3 segundos (com um sonoro je ne sais pas), durou 20 minutos e resultou na troca de Facebooks e convite para voltar.

Em Jerusalém, Mohamed enriqueceu o caminho da rodoviaria até o hotel, fazendo questão de nos apresentar cada detalhe da cidade que percorremos no taxi dele. Foi tão solicito que, dias depois, decidimos passar mais algumas horas em sua compania, fazendo um passeio até o Mar Morto. Aulas de historia e lições de vida que eu não vou esquecer jamais. Sem falar na simpatica moça da pizzaria, no judeu da lojinha que queria negociar os nossos relogios, no muçulmano do suco de romã que ria das nossas piadas, nos cidadãos simpaticos que sempre, sempre!, nos respondiam com um sorriso no rosto, como se soubessem que aquilo nos faria querer voltar. 

Mohamed não é judeu, mas tem alma de negociante e não aceitou os 270 shekels que lhe oferecemos para nos levar de Jerusalém a Tel Aviv, mas não nos deixou na mão. Ligou para alguns amigos e em poucos minutos convenceu Abed a fazer a corrida. Confesso que pegar a estrada em Israel de taxi, às 10 da noite, não me pareceu uma ideia muito segura no começo, mas foi entrar no carro para o medo sumir. A estrada é incrivel porque o pais investe muito no turismo e sabe que Tel Aviv-Jerusalém é trajeto obrigatorio para quem visita o pais (não tem aeroporto em Jerusalém). Uma hora depois, ja estavamos na porta do nosso hotel, seguros e felizes, graças ao bate papo esclarecedor que tivemos com o Abed, outro muçulmano que nos deu a versão deles da historia.

O que me chamou muito a atenção é o carinho que os israelenses (judeus, muçulmanos e cristãos) têm pelos brasileiros. Antes de começar uma conversa, sempre nos perguntavam de onde vinhamos. "Brazil? Welcome!". Foi assim o tempo todo, o que me fez pensar que com outras nacionalidades poderia ser diferente, dai Mohamed nos explicou que os italianos, por exemplo, (romanos principalmente) não são bem-vindos por la. Se considerarmos as guerras judaico-romanas, faz sentido. Então, me dei conta das vantagens de ser brasileira e não ter problemas para entrar em pais nenhum no mundo. Quem viaja muito, sabe o valor que isso tem. Ja que podemos, por que não deixar um pouco de lado aqueles destinos tradicionais para nos aventurarmos em outros mais exoticos, como Israel? Um pais que tem cultura, historia, infra-estrutura e diversão, mas que acima de tudo, tem gente - do tipo que Paris nenhuma tem.

Leia mais:
Israel: o que você precisa saber antes de ir
Tel Aviv, o que fazer?
Os lugares mais sagrados de Jerusalém

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Alugar um apartamento na França

Eu, que ja não sou muito chegada em nenhum tipo de mudança, fico de cabelos em pé quando preciso trocar de apartamento. Faz um mês que eu e o Léo estamos correndo atras de um canto novo para morar, não é facil. Ja comentei aqui no blog que trocar de apartamento na França da um trabalhão. Primeiro, temos que escolher com precisão a melhor época para mudar - no verão todo mundo viaja (então não sobra nenhum amigo para ajudar com as caixas) e no inverno... bem, tem que ser meio idiota para querer fazer mudança em pleno inverno. Feitas as contas, é preciso enviar uma carta para a imobiliaria informando que em 90 dias vamos deixar o apartamento. Sim, a carta deve ser enviada com 3 meses de antecedência e não, não tem essa de telefonar ou passar um email, tem que ser carta assinada e enviada pelo correio mesmo. So depois a cabeça fica livre para começar a procurar outro lugar.

Todos os dias olhamos anuncios na internet e, quando estamos na rua, ficamos atentos às placas de 'aluga-se'. Não bastasse a dificuldade de encontrar um cantinho legal, que não custe os olhos da cara e que seja razoavelmente limpinho, ainda é preciso casar as datas - os poucos aptos que nos interessaram até agora serão desocupados antes de dar os nossos 3 meses ou muito depois, ou seja, não servem pra gente. Claro que esse tipo de trâmite não foi feito para facilitar a vida do cliente, o importante é que os imoveis passem o menor tempo possivel desocupados, fazendo lucrar as imobiliarias e os proprietarios. Ja contei que na França cliente é tratado como pano de chão, né? Pois é.

Esse esquema dos 3 meses é absurdamente irritante. Durante esse tempo, somos obrigados a receber todos os interessados no nosso apartamento. O engraçado é que a imobiliaria nem entra no negocio. O interessado vê o anuncio, liga para eles e eles passam o telefone do Léo, que marca a visita. O Léo recebe as pessoas, faz o tour, responde as perguntas, leva na garagem, no bosque que tem no quintal, abre armario, fecha armario, fala sobre as despesas com conta de energia, sobre a barulheira que os vizinhos de cima fazem e até sobre o horario que bate sol na sala. So falta pegar na mão e sair para passear. Uma senhora francesa saiu daqui querendo adotar o meu marido, de tão gentil que ele é. Mas quando somos nos do outro lado da moeda, ai, meus caros, a coisa muda.

Infelizmente, ainda não encontramos ninguém que nos recebesse bem nas visitas que fizemos. Claro que é chato ficar abrindo a sua casa para um monte de gente desconhecida analisar (vocês não têm noção de como é desconfortavel!), mas, sei la, simpatia e generosidade vêm de berço, não? Pô, ja é um saco sair de casa sabendo que vamos atrapalhar o jantar alheio, precisa de cara feia para piorar a situação? Sério, é brochante. O mais "simpatico" até agora foi um cara esquisito que nos suportou por exatos 3 minutos na casa dele. "Aquela é a sala, ali é a cozinha, o banheiro fica à direita e os quartos, no fim do corredor. Au revoir!".

Oi? Sera que eu poderia pelo menos entrar?

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

A mãe dá a vida, o pai dá o sobrenome

Visto de estudante vencendo e la fomos o Léo e eu para a fila da prefeitura dar entrada no meu titre de séjour, o papel que garante que, eu poderia estar roubando, poderia estar matando, mas estou pedindo honestamente para ficar, dotô. O que ja vi de brasileiro fazendo drama por causa dessa fila não é brincadeira! Eh um tal de 'deu tudo errado' pra ca, 'fui maltratada' pra la, que fui esperando pelo pior. Madrugamos para garantir que seriamos um dos primeiros a ser atendidos, pois desde muito cedo a fila ja fica lotada de imigrantes procurando mais ou menos pela mesma coisa que eu.

O segredo é saber driblar a burocracia francesa. Como é que alguém tem coragem de aparecer por la sem ter em mãos TODOS os documentos que eles pedem antes? Acreditem, de cada dez pessoas (e dai sou eu chutando pelo que pude ver), pelo menos a metade sai de mãos abanando porque esqueceu de xerocar um documento ou de tirar uma foto. E o pior: sai xingando, como se tivesse razão. Esta vindo morar na França? Lição numero um: francês adora um pedaço de papel. Sério, eles têm tesão em papel, documento, carimbo e vão fazer de tudo para te afundar na burocracia desorganizada e ultrapassada deles.

A unica parte tensa da entrevista foi quando a moça tentou colocar o sobrenome imenso do Léo no meu documento. Se eu escolhi não adotar o sobrenome dele, é justamente porque faço questão de assinar Mirelle Matias Siqueira até o fim da vida, minha senhora. Escreveu ai? Mi-re-lle Ma-ti-as Si-quei-ra, assim mesmo, dois éles e ê no final. Quase bloqueamos todo o sistema da prefeitura porque a moça não sabia como proceder em um caso assim, tão fora do comum. Precisou da chefe interferir para descobrir como cadastrar no sistema uma senhora casada que faz questão de manter o seu sobrenome de jeune fille

Jeune fille, bem ao pé da letra, quer dizer 'mocinha'. Ha! Mocinha, eu? Pois é essa a nomenclatura dada aos sobrenomes das mulheres solteiras ou das que não adotam os sobrenomes dos maridos depois do casamento, o que ainda é muito raro por aqui. A imensa maioria nem pensa em ir contra a maré e abre mão do sobrenome do pai para assinar o do marido numa boa. Não seria mais sensato dizer nom de célibataire, ou seja, sobrenome de solteira? O 'sobrenome de mocinha' é so um dos exemplos claros da sociedade patriarcal que os franceses fazem questão de manter. Outro exemplo é o campo que, se der tudo certo, vai ficar em branco na minha carte de séjour, o épouse de (esposa de). Sim, porque aqui na França não basta que eu seja a Mirelle, eu preciso ser a Mirelle-esposa-de-alguém e isso tem que ficar bem evidente em todos os documentos oficiais. Se eu não fosse a esposa do Leonardo, eu seria a filha do fulano de tal - o pai, pois, desde o século XI os franceses recebem apenas o sobrenome do pai. "A mãe da a vida, o pai da o sobrenome", é um famoso ditado popular francês. So em 2002 foi aprovada uma lei que tenta remediar a desigualdade dos sexos nas regras de transmissão de nome, permitindo que a mãe também coloque o seu sobrenome nos filhos. 2002, minha gente, dia desses!

Embora isso ja seja permitido, esta longe de virar tradição. As familias (homens e mulheres) continuam optando por colocar apenas o sobrenome do pai nos filhos. Eh que aqui na França as pessoas costumam ter apenas um sobrenome ou, no maximo, um nome composto + um sobrenome. Toda vez que perguntam ao Léo o seu nome completo, a cena se repete: olhos arregalados ao escutar a quantidade de silabas que sai da boca dele. Letras que, nunca, jamais!, cabem nos espaços desenvolvidos para eles: franceses que carregam apenas o sobrenome do pai.

domingo, 2 de janeiro de 2011

O réveillon na França

Desde que cheguei na França escuto o discurso de que 'os franceses são fechados, mas quando viram amigos é pra valer'. Realmente, leva-se um tempo para conquistar a confiança deles. Nos, brasileiros, temos esse jeitão de falar com todo mundo, de chamar para ir em casa assim que conhecemos. Mal disse o nome e opa!, melhores amigos de infância! Mas aqui não é assim, não. Essa simpatia imediata nem de longe corre na veia dos franceses. Dai, a fama de antipaticos. Mas na verdade, eles não são. Quer dizer, são. São e não são, entende? Em um primeiro momento sim, são frios, mas depois... Por exemplo, é dificil sair para comprar pão e ser atendido com um sorriso no rosto, mas entre amigos a historia é diferente. E é justamente ai que mora o problema. Para virar amigo, minha gente, é chão que não acaba mais!
 

Depois de um ano conhecendo francês babaca (sim, porque idiota tem ai e tem aqui também), tive a sorte de tropeçar nesses dois caras ai da foto. E toda vez que vocês me virem escrever "meus amigos franceses", provavelmente eu vou estar falando deles. Claro que eles não são os unicos, felizmente existe a Maud, o Sébastien, o Antoine, a Valérie e tantos outros franceses bacanas que conhecemos até aqui, mas o Sylvain e o Raphael são especiais. Com eles o caminho foi mais curto. Eles não precisaram de tanto tempo para constatar o obvio: que eu e o Léo somos, além de irresistiveis, suuuper legais! Os meninos são tão bacanas, que ja viraram irmãos. Pois bem, fofos assim, é obvio que eles nos arrastaram para a festa de réveillon deles.

E assim viramos o ano: eu, o Léo, os meninos e mais uma penca de franceses esperando 2011 chegar. Preciso dizer que foi punk. Se eu tivesse ganho na euromilhão, comprava passagens para todos eles passarem o proximo réveillon na praia de Copacabana, onde se DeusJesusMariaJosé quiser, estouraremos nosso champanhe francês no proximo fim de ano. Acho justo que todo filho de Deus aproveite, pelo menos uma vez, aquela deliciosa muvuca carioca. Existe lugar melhor para aprender a festejar?

Por aqui, eu fui a unica mãe de santo da festa, ja que eles não têm a tradição de passar a virada vestidos de branco - alguns estavam de camisa branca, mas por puro acaso. Me enrolei toda para explicar o meu modelito monocromatico e fiquei ainda mais estranha (aos olhos deles) quando contei que o meu povo é chegado numa mandinga de final de ano.  Eh um tal de pular sete ondas pra ca, de comer lentilhas pra la... e claro, contei que à meia-noite todo mundo fica nu (mentirinha basica para botar pilha em festa de francês). Ao contrario de nos, eles não têm muitas superstições para a virada, o mais popular talvez sejam os beijos embaixo do visgo. Ninguém soube me explicar o porquê, mas parece que beijar as pessoas que você gosta à meia-noite, embaixo dessa plantinha, traz sorte. Eu nem sou muito chegada em tradições francesas, mas dessa vez fiz questão de abrir uma excessão.

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